O primeiro dia do Inova Trade Show (ITS), realizado em 12 de junho, debateu a sustentabilidade no agronegócio em programação que contou com a curadoria da Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa do Agronegócio (Fundepag). O evento é promovido pela Fundação Fórum Campinas Inovadora (FFCi) e pela Prefeitura Municipal de Campinas, no Pátio Ferroviário de Campinas e faz parte da Campinas Innovation Week.
O encontro reuniu importantes nomes do setor para discutir temas como sustentabilidade, ESG (Environmental, Social and Governance) e a promoção de produtos artesanais. O presidente da Fundepag, Álvaro Duarte abriu a programação enfatizando a importância do evento para o setor. “Neste primeiro dia trouxemos um olhar para agricultura e meio ambiente e como devem caminhar daqui para frente, focando em sustentabilidade”.
A diretora da Fundepag, Adriana Verdi destacou a valorização dos produtos artesanais e a sustentabilidade social. “A Fundepag promoveu a vinda de 30 pequenos produtores artesanais e dois arranjos produtivos locais. São produtos de alta qualidade que merecem estar em qualquer vitrine. Vamos apoiar esses produtores, promovendo a sustentabilidade social”.
“Estamos comprometidos em trazer segurança e inovação para nossa pesquisa e produção. A ILPF – Integração Lavoura-Pecuária-Floresta, em particular, tem um grande potencial para o nosso agronegócio”, declarou o diretor executivo da Rede ILPF, presidente do Conselho de Administração da Fundepag e do LIDE Agronegócios – um dos mais importantes encontros de líderes do agronegócio do País -, Francisco Matturro ressaltando a relevância das estratégias de produção sustentável.
Cadeia agroalimentar sustentável
O painel sobre a Cadeia Agroalimentar Sustentável reuniu especialistas que discutiram o futuro do setor, ressaltando a importância da parceria público-privada e as estratégias para um desenvolvimento mais sustentável. Francisco Matturro destacou a importância das tecnologias disruptivas na agricultura brasileira, a ILPF, um projeto que nasceu na Embrapa e que hoje conta com a manutenção da iniciativa privada.
Em sua apresentação, Matturro destacou três grandes revoluções no agronegócio brasileiro: o plantio direto no início dos anos 70, a introdução da segunda safra e os sistemas integrados de produção, como a ILPF. “A Integração Lavoura-Pecuária-Floresta já alcança 18 milhões de hectares no Brasil, representando 33% da área plantada de grãos. Além disso, é responsável pelo aumento de 41% na biodiversidade do solo, uma melhoria de 74% na qualidade do solo e seis vezes mais eficiência no uso da terra”, explicou.
“Com o objetivo de atingir 35 milhões de hectares em ILPF até 2030, a Rede ILPF apoia as pesquisas da Embrapa, promove programas de treinamento e transferência de tecnologia e contribui para o desenvolvimento de políticas públicas”, afirmou Matturro. Ele também destacou que a WWF (World Wide Fund for Nature) reconhece a ILPF como uma estratégia eficaz para reduzir o desmatamento e melhorar a qualidade ambiental.
Em sua apresentação, o presidente da Associação Brasileira de Alimentos (ABIA), João Dornellas ressaltou o papel do Brasil como um dos principais exportadores de alimentos industrializados. “Desde 2018, o Brasil se consolidou não apenas como o celeiro do mundo, mas também como o supermercado do mundo. Em 2023, exportamos 72 milhões de toneladas de alimentos industrializados”, informou. No mesmo ano, a indústria de alimentos contribuiu com 52% da balança comercial brasileira e investiu R$ 12,3 bilhões em ESG.
Dornellas enfatizou a necessidade de soluções para evitar o desperdício e a insegurança alimentar. “Todas as propostas para produzir mais e gastar menos devem ser analisadas, e é nosso papel como indústria e sociedade civil buscar soluções para evitar o desperdício,” acrescentou.
O diretor de Negócios da Agro/Smart Agriculture América Latina na Bosch Brasil, Mathias Schelp mostrou os investimentos da empresa em tecnologias para a vida. “A agricultura global representa 18% das emissões de gases de efeito estufa no mundo e o Brasil é uma referência em matriz energética, com 55% provenientes de fontes renováveis”, destacou.
Schelp apontou que a demanda por alimentos aumentará 45% até 2050 e o Brasil deve assumir um papel de liderança graças às suas vantagens comparativas. “Precisamos olhar para todo o sistema energético, com atenção para as práticas agrícolas e a transição dos sistemas alimentares. A chave para atender a essas demandas é a transformação digital”, concluiu.
O Futuro dos alimentos
A sócia-fundadora da Redesenha, Cristiane Guerreiro abriu o segundo painel do Inova Trade Show, com o tema “O futuro dos alimentos” trazendo uma visão sobre a produção sustentável, enfatizando a importância de relações comerciais justas e a redução do desperdício, que chega a 45 quilos pessoa/ano no Brasil. “Precisamos pensar em toda a cadeia, desde o produtor rural até o consumidor final, incluindo embalagens biodegradáveis e a logística de distribuição”, defendeu.
O vice-presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG), Ingo Plöger abordou a evolução da alimentação humana, destacando que um terço da área do planeta é dedicada à produção de alimentos, totalizando 6 bilhões de toneladas por ano. “O Brasil é um grande player na produção de proteína animal, com a soja sendo principalmente utilizada para alimentação animal”, afirmou Plöger.
Ploger também destacou o papel do cooperativismo brasileiro, afirmando o modelo brasileiro não é encontrado em nenhum outro lugar do mundo. Segundo ele, hoje as cooperativas são fundamentais para a produção, investimentos econômicos e sociais. Abordou ainda o desafio da alimentação do futuro, considerando uma população de 8 bilhões de pessoas em dez anos, sendo 1% abaixo do peso e enfrentando insegurança alimentar. “A insegurança alimentar é um problema de todos, precisamos olhar o nosso mapa da fome e ali começar a trabalhar o alimento do futuro, entendendo o que precisa ser feito em termos produtivos e de preço para alimentar essa população”.
O CEO e fundador da SciCrop, José Damico defendeu a importância da tecnologia para o agronegócio, especialmente a Inteligência Artificial (IA). “Nos últimos 10 anos, as tecnologias começaram a se basear fortemente em dados. A IA é a maior mudança da humanidade, permitindo novas formas de produção e aprendizado”, defendeu Damico, que também alertou sobre os riscos éticos da inteligência artificial.
Já a vice-diretora do Instituto de Tecnologia de Alimentos (ITAL), Gisele Anne Camargo abordou as tecnologias envolvidas na produção de alimentos. Ela ressaltou que a humanidade utiliza processos de conservação de alimentos desde os antigos egípcios e que a segurança alimentar depende da segurança dos alimentos. “Hoje, o alimento precisa ser mais saudável e sustentável, com foco em ética animal, cuidado social e alinhamento com os 17 ODS – Objetivos de Desenvolvimento Sustentável”, explicou Gisele. Ela destacou a importância de tecnologias emergentes, como biotecnologia, fermentação de precisão, Big Data e IA para o futuro da cadeia alimentar.
Biodiversidade e agricultura
“O Brasil abriga 20% de todas as espécies de plantas e animais do planeta”. Com essa informação, a gerente geral da Brazbio, Priscylla Moro abriu o terceiro painel “Biodiversidade e Agricultura”. Em sua apresentação, ela mencionou um estudo conduzido por uma equipe internacional de pesquisadores liderado pelo Centro de Pesquisa em Resiliência de Stockholm, na Noruega, que definiu nove fronteiras planetárias como indicadores das funções que sustentam a resiliência do planeta: mudança climática, integridade biológica, uso da terra, nitrogênio e fósforo, ciclo do fósforo, ciclo do carbono, acidificação dos oceanos, mudança no uso da água doce e aerossóis atmosféricos. Priscylla alertou que seis dessas fronteiras já foram ultrapassadas, sendo a integridade biológica uma das mais ameaçadas.
Ainda discutindo a relação entre biodiversidade e agricultura, Priscylla enfatizou que a principal fonte energética da alimentação humana provém de apenas quatro espécies: arroz, batata, trigo e milho. “Embora existam aproximadamente 30 mil espécies de plantas comestíveis no mundo, nossa dieta atual se resume a menos de 1% desse total”. Ela explicou que a agricultura moderna priorizou a redução da biodiversidade para atender a demandas de escalabilidade. “Nesse contexto, o sistema de agrofloresta, que inclui a inserção de árvores no sistema de cultivo, contribui para aumentar as relações ecológicas, a resiliência dos sistemas e oferece diversas fontes de renda, melhorando a saúde do solo e a ciclagem de nutrientes e de água”.
A pesquisadora científica da Agência Paulista de Tecnologias dos Agronegócios (APTA), Maria Tereza Vilela Nogueira Abdo discutiu como a biodiversidade pode favorecer os sistemas ecossistêmicos de maneira significativa, tanto pela provisão de materiais e regulação das condições ambientais, quanto por benefícios culturais que não estão associados ao lucro. “Falar em biodiversidade é considerar a riqueza de espécies de uma região, onde cada espécie tem o seu papel na natureza e essa função ecológica é fundamental para o equilíbrio do ecossistema”, afirmou.
Tereza ressaltou que o Brasil, ocupando quase metade da América do Sul, possui a maior biodiversidade do mundo, com 10 a 15% das espécies conhecidas. O País abriga mais de 116 mil espécies animais e mais de 46 mil espécies vegetais espalhadas por seis biomas terrestres e três grandes ecossistemas. Ela também mencionou as áreas conhecidas como Hot Spots, regiões naturais com alto grau de devastação e fragmentação que, apesar disso, ainda abrigam espécies raras. Essas áreas críticas de conservação representam apenas 1,4% da superfície terrestre, mas concentram mais de 60% das espécies vivas. A pesquisadora destacou a importância de proteger as florestas em pé, restaurar áreas degradadas, manter uma relação sustentável entre restauração e produção, além de explorar produtos e subprodutos de florestas.
O também pesquisador científico da APTA, Sebastião Wilson Tivelli, presidente da Rede de Pesquisa Regional de Agroecologia, aproveitou a oportunidade para enfatizar que sem pesquisa não é possível aproveitar plenamente a biodiversidade do Brasil. Em sua apresentação, Tivelli destacou o programa de fomento à produção e consumo de Plantas Alimentícias Não Convencionais (PANC), utilizando a bioeconomia e a rica sociodiversidade do estado de São Paulo. Ele mencionou que, infelizmente, os produtores agrícolas geralmente não conseguem definir os preços de venda de seus produtos, sendo a indústria quem determina esses valores.
Tivelli também discutiu o Projeto Farmácia Viva da APTA, ressaltando que a organização da sociedade civil é crucial para exigir a implementação de políticas públicas consistentes, independentemente das mudanças políticas. Segundo ele, o escalonamento do sistema de Farmácias Vivas passa pela conscientização da classe médica e pelo enfrentamento do lobby da indústria farmacêutica. Ele defendeu que é necessário fazer mudanças para que as Farmácias Vivas possam ser implementadas não apenas nas Unidades Básicas de Saúde (UBS), mas também em casa, juntamente com as PANCs, como o ora-pro-nóbis. Tivelli concluiu afirmando que todos os agentes políticos devem atender às demandas da população para garantir o sucesso desses programas.
Tecnologias e projetos para impulsionar o crescimento econômico
“A bioeconomia é um modelo econômico emergente que utiliza a biodiversidade e os recursos biológicos de maneira sustentável para promover o desenvolvimento econômico e a preservação do meio ambiente,” explicou a supervisora de Projetos e Tecnologia do Instituto SENAI de Tecnologia em Alimentos e Bebidas, Lívia Bernardes, na abertura do painel “Tecnologias para impulsionar o crescimento econômico”. Em sua apresentação, ela destacou quatro setores-chave da bioeconomia: agricultura e silvicultura, química e energia, biotecnologia, e alimentação e nutrição.
Além disso, Lívia enfatizou a necessidade de inovação e tecnologia para desenvolver soluções sustentáveis. “Novos processos, materiais e produtos precisam ser criados, aproveitando avanços em áreas como biotecnologia, nanotecnologia e inteligência artificial”. Ela sublinhou que investimentos em pesquisa e desenvolvimento são essenciais para transformar a biodiversidade em negócios lucrativos e ecologicamente responsáveis. Parcerias entre institutos de inovação, universidades, empresas e governo são fundamentais para acelerar a inovação na bioeconomia.
A inovação aberta no setor agrícola foi um dos pontos altos da apresentação do coordenador do Instituto SENAI de Inovação em Materiais Avançados, Anderson Maia. Ele mencionou áreas de atuação do SENAI, como bioprocessos com microrganismos, biorremediação, biocatálise e scale-up, além de projetos com células animais, analítica avançada, biossensores, engenharia genética e desenvolvimento de biomoléculas, produtos de base biológica, tecnologia de materiais sustentáveis, compósitos e nanomateriais, e materiais poliméricos sustentáveis.
Maia também levantou o debate sobre o sequestro de carbono, destacando que “a agricultura pode ser uma grande parceira no desafio global de capturar parte do gás carbônico da atmosfera e armazená-lo de forma segura no solo, contribuindo para a mitigação do efeito estufa”.
Encerrando o primeiro dia de apresentações, o professor e pesquisador do Instituto Federal de São Paulo, Sérgio Azevedo apresentou a Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (EMBRAPII), criada para aproximar universidades e instituições de ciência e tecnologia da indústria. Ele detalhou o modelo de contratação da EMBRAPII, que facilita a negociação direta com as unidades, sem necessidade de edital, compartilhando custos e riscos ao investir recursos financeiros, infraestrutura e capital humano em tecnologias inovadoras. O professor enfatizou a importância da colaboração entre academia e indústria para a inovação tecnológica e a reindustrialização do País, destacando a disponibilidade de recursos significativos para apoiar esses projetos.
Saiba mais sobre a programação da 10ª edição do Inova Trade Show aqui.