Telhados verdes têm sido apontados como uma das possíveis soluções para o combate às mudanças climáticas nas cidades. Isso porque, além de permitirem a captação de água da chuva e a produção de hortaliças no alto dos edifícios, eles também são capazes de gerar microclima, reduzindo a temperatura local e o gasto energético com refrigeração, por exemplo.
Uma equipe internacional de pesquisadores criou um modelo – que pode ser aplicado a qualquer cidade do mundo – capaz de mensurar os custos e os benefícios ambientais da implementação e do uso de telhados verdes como estruturas capazes de contribuir com os sistemas de alimentos, água e energia. Conduzido por pesquisadores da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Beijing Normal University (China), Wuhan University (China), Xiamen University (China) e Yale University (Estados Unidos), o trabalho foi apoiado pela FAPESP no âmbito da chamada “Nexo Urbano de Alimentos, Água e Energia”, lançada em parceria com o Belmont Forum e o JPI Urban Europe no âmbito da Sustainable Urbanisation Global Initiative.
“Muito se fala sobre o impacto dos telhados verdes na sustentabilidade das cidades, mas qual é o real efeito dessas estruturas sobre recursos importantes, como água, alimentos e energia? Nesse estudo criamos um modelo para auxiliar os tomadores de decisão na análise de custos e benefícios dessas estruturas verdes urbanas. Verificamos de onde vêm os recursos de água, energia e alimentos de cada cidade e como a implementação de uma série de tetos verdes poderia beneficiar esses três sistemas. Para finalizar, testamos o modelo em cidades com características tão distintas quanto São José dos Campos, no Brasil, e Johanesburgo, na África do Sul”, afirma Rodrigo Bellezoni, pesquisador da FGV e um dos autores do artigo publicado na revista NPJ Urban Sustainability.
No trabalho, os benefícios da implantação dos telhados verdes são calculados a partir de uma abordagem ampla, que leva em consideração a produção e o consumo de água, energia e alimentos, bem como as emissões de CO2 associadas.
“Esse é um estudo teórico que visa uma aplicação prática. No mundo todo existe uma demanda crescente por água, alimento e energia. São três componentes que estão conectados e têm forte influência sobre as emissões dos gases de efeito estufa, justamente porque a demanda por esses recursos pode gerar pressão em questões conhecidas como pegada de carbono e pegada hídrica, por exemplo. E os telhados verdes afetam a relação alimentos-água-energia em cidades e têm o potencial de contribuir para a sustentabilidade”, explicou José Puppim, professor da FGV e coautor do artigo.
A comparação entre as duas cidades mostrou que a implantação de telhados verdes precisa levar em conta uma série de fatores. Bellezoni explica que, para infraestruturas como telhados verdes e outras soluções baseadas na natureza, é preciso levar em conta especificidades locais. Nesse quesito, entram questões elementares, como se há produção local dessas estruturas verdes (ou se elas precisariam ser importadas), e até uma compreensão mais aprofundada sobre o que os pesquisadores chamam de trade-offs – por exemplo, se a energia utilizada na produção de componentes desses telhados verdes e no cultivo de hortaliças sobre essas estruturas compensaria o gasto energético envolvido no transporte de alimentos para a cidade. Na simulação, nas duas cidades avaliadas os telhados verdes são neutros em carbono, mas os benefícios são maiores para a implantação dessas estruturas em São José dos Campos do que em Johanesburgo. Enquanto em São José dos Campos os modelos mostraram que a água da chuva captada pelos telhados verdes seria suficiente para compensar a irrigação local para a produção de alimentos, o mesmo não aconteceria em Johanesburgo. Na cidade africana, de acordo com os modelos, a demanda por água continuaria maior do que a capacidade de captação dos telhados verdes. Em Johanesburgo, sobretudo por questões de clima, os telhados verdes não eliminariam por completo a necessidade de irrigação de água de torneira, mas, é claro, diminuiriam essa demanda. Portanto, o resultado da análise de custo-benefício não é o mesmo para as duas cidades.
O estudo utilizou técnicas de sensoriamento remoto para mapear por imagem de satélite todas as superfícies da cidade que pudessem contar com um telhado verde e classificou os edifícios entre residencial, comercial e industrial porque nem toda edificação pode receber um peso de algumas toneladas, por exemplo, para aceitar esse tipo de instalação: foi computado apenas um terço do que potencialmente poderia ser aproveitado como telhado verde. O grupo também criou possíveis cenários de expansão dos telhados verdes. E também calculou quanto de água ou de energia seria consumido em uma produção hipotética de tomates, visando criar ou aumentar a oferta local do produto atualmente produzido fora das cidades.
O artigo The food-water-energy nexus and green roofs in Sao Jose dos Campos, Brazil, and Johannesburg, South Africa pode ser lido em: https://www.nature.com/articles/s42949-023-00091-3#Abs1